Exercício aeróbio em jejum

Há um tempo, ouvi falar que o aeróbio pela manhã, em jejum, era uma boa alternativa para queimar gordura corporal. Na hora achei absolutamente imprudente e absurdo. A explicação inicial era que, pelo fato do organismo ter pouco (ou nenhum) carboidrato à disposição, ele queimaria apenas gordura.

Bom, isso até faz certo sentido, mas eu sempre aprendi que, na falta de carboidrato, o organismo não consegue queimar gordura direito, pois “a gordura queima em uma chama de carboidratos” e, desta forma, o organismo utilizaria a massa muscular, quebrando proteínas e transformando-as em carboidrato para utilizar como fonte energética (tanto na glicólise como na lipólise).

Pois bem, pra mim isto terminara ali. Exercício aeróbio em jejum, independentemente da intensidade, era tolice. Vi amigos meus fazendo e não tendo resultados muito significantes e isto pra mim bastava para acreditar que era mesmo uma perda de tempo.

Porém, recentemente um conhecido me procurou e disse que havia feito e tido resultados bons (perdeu 4kg em 1 mês, fazendo 3x/semana), além dele, outro conhecido dele havia feito e obteve resultados incríveis (perdeu 8kg em 1 mês, fazendo 5x/semana). Além deles, pela internet* encontrei outros depoimentos de pessoas que perderam até 5kg. Em comum, todos afirmam que o peso perdido é praticamente (se não inteiramente) de gordura.

Na internet ainda, várias pessoas sugerem modelos específicos, como manter o jejum depois, ingerir whey antes ou depois, beber água antes, ou tomar café, ou mesmo termogênicos. Enfim, aparentemente é um exercício sem um procedimento bem definido ainda.

A única coisa que parece ser bem estabelecida é que o exercício deve ser de intensidade baixa ou moderada, pois aeróbio de alta intensidade sem carboidrato irá, sem sombra de dúvidas, fazer com que você utilize a proteína da massa muscular como fonte de energia.

Estudos que analisam as respostas do exercício em jejum, ou não, demonstram que:

  • Apesar do gasto calórico total do exercício ser o mesmo, há, SIM, maior consumo de gordura durante o exercício em jejum (da energia proveniente de gordura: 67% em quem faz jejum vs. 50% em quem não faz). Comprovado por menor Coeficiente Respiratório (RQ, em inglês) em exercício na mesma intensidade, por diminuição do Triacilglicerol (triglicerídio) dentro da célula muscular e por altas taxas de ácidos graxos livres no plasma sanguíneo.

    Paulina Rubio andando de bicicleta pela manhã

  • Quando foi acompanhado por um período longo de tempo (6 semanas), mostrou que o organismo tende a aprimorar o mecanismo de queima de gordura em sujeitos que fazem aeróbio em jejum, enquanto no exercício com carboidrato o organismo melhora o mecanismo de utilização de glicose. Porém, os indivíduos não apresentaram perda de peso (a dieta foi controlada para que o balanço energético estivesse em equilíbrio).

Mesmo comprovando que o organismo gasta mais calorias provenientes da gordura e que o metabolismo da gordura é aperfeiçoado, fisiologistas e nutricionistas seguem afirmando que, para perder peso, é necessário o balanço energético negativo e que a realização de exercício em jejum não é necessária. Pois se realizarmos um exercício que gasta mais gordura, teremos excesso de glicose no organismo e, caso não utilizemos, esta será armazenada em forma de gordura. Assim como se fizermos um exercício que gasta mais carboidrato, queimaremos naturalmente a gordura para realizar as atividades diárias.

Conversando com um nutricionista, ele disse que o aeróbio em jejum auxilia a queimar a gordura na região abdominal e, mesmo se não promover a perda de peso nem o emagrecimento (ou seja, se o balanço calórico não for negativo), seria possível “redistribuir” a gordura corporal, desde que acompanhado de uma dieta adequada, pois nutrientes diferentes tendem a se acumular em locais diferentes.

Não satisfeito com todas estas informações, modelos, relatos e especulações, resolvi eu mesmo tentar. Sim, isso mesmo. Durante 5 semanas eu fiz aeróbio de manhã, em jejum, 3x por semana, pra ver o que acontecia. Porém, tomei o cuidado de não alterar minha alimentação, para ver se os resultados seriam obtidos mesmo mantendo o balanço calórico.

Como eu fiz? 3x por semana, jejum matinal, antes do exercício ingeria (eventualmente) uma fruta ou barra de cereal, 40 minutos de caminhada (durante a segunda metade, bebia 500ml de água), após o exercício tomava um comprimido de Vitamina C e bebia mais 1000ml de água durante os próximos 90 minutos, só depois eu me alimentava. Este foi o mesmo modelo que meu conhecido (citado anteriorimente) fez.

Resultados: Peso igual (0,5kg a menos); Mais disposição durante toda a manhã e; Leve melhora na definição muscular (especialmente abdominal). Infelizmente eu não fiz análise de composição corporal para saber se meu percentual de gordura teve alterações.

Tom Hanks caminhando

Finalizando, acredito que realmente queima mais gordura durante o exercício e deixa os carboidratos livres para serem utilizados em outra atividade mais intensa. Assim, esta história de aeróbio em jejum até pode ser uma boa idéia para pessoas que querem emagrecer, mas não parece muito útil para quem quer perder peso sem alterar a dieta. (não sabe a diferença entre emagrecer e perder peso? Clique aqui)

Fontes em inglês:

http://www.howtobefit.com/burn-body-fat.htm

De Bock, K.; Richter, E. A.; Russell, A. P.; Eijnde, B. O.; Derave, W.; Ramaekers, M.; Koninckx, E.; Léger, B.; Verhaeghe, J.; Hespel, P. Exercise in the fasted state facilitates fibre type-specific intramyocellular lipid breakdown and stimulates glycogen resynthesis in humans. J Physiol 564(2): 649-660, 2005.

De Bock, K.; Derave, W.; Eijnde, B. O.; Hesselink, M. K.; Koninckx, E.; Rose, A. J.; Schrauwen, P.; Bonen, A.; Richter, E. A.; Hespel, P. Effect of training in the fasted state on metabolic responses during exercise with carbohydrate. J Appl Physiol 104: 1045-1055, 2008.

Dohm, G. L.; Beeker, R. T.; Israel, R. G.; Tapscott, E. B. Metabolic responses to exercise after fasting. J Appl Physiol 61: 1363-1368, 1986.

Fonte em português:

http://www.npng.com.br/forum/topic.asp?TOPIC_ID=67505

 

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* Estou impressionado em ver como tem porcaria na internet. Pessoas que não têm experiência, outras que não têm informação e acham que experiência é tudo. Nesse meio de musculação é uma briga ciência vs. prática tão grande que chega a ser ridículo. Cuidado com o que vocês lêem. Inclusive nos sites que eu indiquei acima (especialmente o em português).

8 comentários

  1. Amigo, se a intenção era fazer exercício em jejum pelo fato de haver pouco carboidrato, seu experimento ficou para outra teoria. Pois ingerindo uma fruta, você ingere uma quantidade consideravel de carboidrato, e um cereal, não precisa nem falar ne? Basta pensar a categoria a que este pertence. Bom, diante disso, voce praticamente quebrou o jejum, e sem duvida alguma, durante suas caminhadas voce conseguiu utilizar apenas os carboidratos ingeridos como a sacarose (fruta) e cereais, sem necessitar portanto da utilização de quantidade significativa de gordura pelo seu organismo. Até mais, conselho: faça um novo experimento sem comer frutas ou carboidratos!

    1. Olá Régis,
      Antes de tudo, muito obrigado pela visita e pela leitura. Comentários são sempre bem-vindos, mesmo que com educação e respeito questionáveis.
      Sugiro que, da próxima vez que você for colocar um comentário duvidando da qualidade do post, você se identifique melhor, para que eu saiba se eu posso aprofundar mais no assunto ou se estou falando com algum leigo. Como você não comentou nada sobre isso, vou considerar a segunda opção.
      Vamos lá: Primeiro, nas frutas, o principal carboidrato é a frutose, e não a sacarose.
      Segundo, quanto a utilização de um carboidrato como estes citados, talvez você não saiba, mas eles, em geral, possuem um baixo índice glicêmico. Sendo assim, a transformação dos mesmos em energia não ocorre a tempo desta ser utilizada nos 40 minutos de exercício propostos.
      Terceiro, se fosse possível utilizar o carboidrato do alimento a tempo, podemos considerar a quantidade de calorias em uma fruta (maçã = 64 kcal, laranja = 43kcal, mamão papaya = 88 kcal) ou em uma barra de cereal (aprox. 95 kcal) e subtrair da quantidade gasta em 40 minutos de caminhada, por um homem (de 190 a 250 kcal). Fazendo isso, percebemos que é matematicamente impossível que eu tenha utilizado apenas o carboidrato do alimento ingerido (isso, ainda, se o exercício tivesse começado, pelo menos, 20-30 minutos após a ingestão, o que não foi o caso).

      Espero ter tirado suas dúvidas quanto esta temática e obrigado pelo “conselho”.
      Um abraço,

      1. Infelizmente vc fez errado. A única coisa que se a se ingerir são 500ml de água e nada mais. Mesmo uma colher de farelo de aveia já quebraria o jejum em termos de carbo e até mesmo uma dose de Whey zero carbo. Após terminar mais 500ml e depois de meia hora comer conforme a dieta.

      2. Olá Eduardo.

        Sugiro que você leia o comentário do Régis (logo acima), pois lá eu respondo a uma “sugestão” bem parecida com a sua.
        Obrigado pela visita

  2. Grande Fábio!
    Antes de mais nada, gostaria de parabenizá-lo pela criação do blog. Muito enriquecedor com matérias e artigos interessantíssimos.
    Qto a esta matéria, achei instigante. Pesquisarei muito a respeito para saber se mesmo com o aeróbio ( em baixa intensidade) em jejum, o organismo não faria gliconeogênese. O que vc acha Fábio? Mais uma vez, parabéns pelo blog. Contribuirá e muito para aprender e trocar várias informações na profissão.
    Quando der, apareça na Natatorium.
    Abraço

    1. Fala Victor!
      Obrigado pelo contato e pelas congratulações, cara.
      Quanto a sua dúvida, acredito que a gliconeogênese acontecerá, sim, mas em baixíssima quantidade.
      Para dar uma contextualizada: Há vários estudos comprovando que o exercício com suplementação de carboidrato aumenta a performance, isso está bem claro. Estudos mais recentes já mostraram que o exercício em depleção de carboidrato aumenta a metabolização de gordura. Desta forma, a ideia de fazer exercício em jejum vai, de fato, aumentar a metabolização de gordura.
      Não fui atrás de estudos que falam especificamente da gliconeogênese, mas acredito que a pouca glicose disponível deve ser suficiente para sustentar o metabolismo de ácidos graxos livres em uma intensidade baixa. A gliconeogênese, caso ocorra, deve ser bem pequena.
      Ainda assim, sou favorável a utilização do aeróbio em jejum como um complemento do treino aeróbio. O exercício aeróbio de baixa intensidade não melhora condicionamento físico – em alguns casos até piora. Por isso o exercício em jejum deve ser uma alternativa para benefícios estéticos ou (talvez) recuperativos. O exercício de alta intensidade melhora, sim, a aptidão aeróbia e tem um gasto calórico maior. Porém, em excesso, pode causar lesões ortopédicas e, para algumas pessoas, são uma opção inviável (cardiopatas e hipertensos com a patologia não controlada, por exemplo).
      Fica como sugestão que tu tente fazer – por um mês, talvez – e tire suas próprias conclusões. Se não funcionasse de maneira razoável, fisiculturistas não utilizariam em período pré-competitivo.
      Espero ter conseguido te ajudar um pouco. Me coloco a disposição para tentar esclarecer futuras dúvidas.
      Mais uma vez obrigado pelo contato.
      Abração

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